terça-feira, 24 de junho de 2014

(( visão poética d+e mariA ~:>





a maioR violência, e a maior benesse, é a das flores, que o tempo todo
nos força ao martírio do arte,

ao canto ajeitadinho do menino com sua namorada, à persistência no
bem :: cola-se a cidade ao meu ouvido,

como forma de ouvir nossos filhos :: porque sou grande, tenho a
persistÊncia :: porque cuido, sou do bem :: o amor é nossa

violência carnal, sua e minha :: é nossa voz e um violão, um pandeiro, as luzes
da esquina, uma lâmpada acesa :: sinto

saudade infinita de teus pistilos, de tua corola ardente :: e segue o boêmio altivo,
ébrio da altura com que se enfeita, do par de asas

que é um vulcão :: ele se enfeita para ti, ó adoradinha, enfeitado de cor e
visão febril, como o anjo pop

homérico dessa violência nacional :: cuido de tua graça amiga, da cor de tua
amizade, dos teus seios,

do batom, da tua experiênciA revolucionáriA :: a pintura espanta o elemento
mal e humano ::

teu lápis de olho é sagrado, tuas sapatilhas :: teu namoradO é senhor de muitas
colmeias, o deus

da recolha de um mel escondido :: transforma essÊncias em pensamentos e loas, em
coisas boas e viris ::

atrapalha o trânsito acendendo o sábado :: é pura juvenil perturbação incendiária ::
é pura domesticação

da natureza mais agreste e gentil :: conversa com lobos, golfinhos e baleias ::  te faz
carinho, acarinha, colore e aquece

a televisão :: usa pólvora doce, reclama os atrasados, defende os
oprimidos :: teu namorado é poesia e nascimento ::

anda sem revólver, a par de todo o sentimento anímico e perturbador da
cidade, por ti :: tu és

a bíbliA, a sensação, o motivamento :: tu és o que todo homem quer,
africanizando sentidos pueris ::

tua és a manada de javalis, a reencarnação em segredo da poéticA visão de
mariA :: tu és o meu

mais prometido e pacificado, difícil e abençoado império :: e nelE, aprendo a
dormir e sonhar

contigo, sem segredos, por toda a eternidadE ::

terça-feira, 17 de junho de 2014

luLa, chico, esquerDa, dirEita, e o heXa




amamos a diversão e, por isso, fazemos com maestria e doutoralidade aquilo que 
o mundo mais 

ama - o futebol:: tornar-se potência mundial e, portanto, conquistar a admiração e o 
reconhecimento da 

população inteira de um planeta, por intermédio de uma brincadeira, é um carinho 
que se dá à vida 

((como se fosse um beijo na bola, que metaforicamente, então, é o beijo que se dá na 
barriga de uma 

mulher grávida :: somos a pátria dos grandes mistérios encravados, das forças 
e folias surpreendentes :: do mesmo

modo que nos tornamos campeões naquilo que é aparentemente inútil - um jogo, 
uma molecagem,
e isso "não tem preço", em um mundo tensionado pelas competições reais da indústria e do 
comércio -
elegemos luLa e o pT, a primeira força real trabalhadora a assumir o controle de um país de 
modo
democrático :: a vitória do líder operário atualizou para a humanidade a utopiA 
da revolução franceSa, do povo no poder,
sem que em nenhum outro lugar do mundo se tivesse tal fato :: nem mesmo a 
fRança, mater da ideia
de revolução, logrou tal conquista, nem mesmo quando tentou reeditar-se em 
termos revolucionários, com o maio de 68 :: 






cabe ao Novo Mundo, nas améRicas, forçar o vencimento de barreiras que a Velha 
EuroPa sequer percebe
que existem :: o mesmo, evidentemente, se deu com o futebol, inventado na inglAterra, 
país ao qual nunca
cedeu maiores glórias :: coube ao bRasil retirá-lo de um certo europeísmo limitador da 
graça e da alegria:: quando luLa
vencEu, o país inteiro curvou-se e, pelo menos por um diA, foi exaltadA a chegadA real da 
plebe ao trono ::
nada disso, no entanto, é estável :: antes, é suscetível a intermináveis ataqueS da legiÃo de 
maus humoREs
humanos - sobretudo machistas e violentos - que não admitEm a conquista dA felicidade 
como algo
físico, real ((o sonhado paraíso na teRRa, mito fundaDor da cristandade ocidental e, 
por essÊncia, da própria brasilidade :: o miTo reforça-se
pela repetição, e a expulsão do paraíso é um processo interminável :: crisTo e suas 
quimerAs precisarAm
sofrer do mesmo tipo de ataquE, para ressuscitAr "três dias depois", e quatrocentos anos 
mais tarDE,
deiXando o oCidente mais complExo, ao tornar-Se a religião ofiCial de romA e fundir-se 
definitivamente
aos mitos helênicos da grÉcia antiga :: no bRasil moderno, nossa legião de meninos de ruA 
reforça







o mesmo enredo :: como filhos de uma gente mestiça, recebem o abandono da favelA, a tristeza estatística 

de sua condenação a um futuro inexistente :: mas revivem na glória de uma ressurreição improvável, são 

craques dribladores, fornecem o substratO de nossA imperial força futebolística, são a 
reconquista do sonho
por vias mais do que tortas, tortas como as própRias perNas de garRincha, ou 
os espinhos na coroa de cristo :: não há relação nítiDa entre futebol
e políTica, mas a interpretaçãO poéTica profuNDa conseguE ver que, por interméDio da seleÇão e daquilo que foi luLa 

((outro menino abandonado, diga-se de passagem)), o mundo espEra de nós esse avanço do inominável, de 

uma certA magia que nenhumA outra nação conseguE colocAr em práTica :: somos o país do impossíVel - é isso; 

somos uma permissão maior parA que as funduras do oceano mítico se exprEssem, venhAm à tona, 

e reveLem o miTo encarNado, mostrem a imaginação infinita dos ser humano fundida a 
seus deuses e demônios, o bem e o mal;
o que se conseGue por meiO da cRuz (a sacrificação do próprio povo) e do 
carnaval ((sua doce 

redenção no mistério da brincadeira mentirosa, que mente sobre a realidade da vida, 
mas que é a única coisa capaz de proporcionar a verdadeiRa felicidade
de meninos-homens, desviando-os do tráfico, da corrupção, da morte :: a fundura mítiCa 
de uma sociedade
miscigenada como o bRasil, diferenTe de qualquer outro grande 
país (japão, alemanhA e até mesmo
o também caboclizado esTados uniDos), verte rios de sangue perfuMado, menstruaÇão 
docE somente mostRada e compreensível
se for de modo artístiCo, como nas obrAs de chICo buarQue :: pela comemoração do aniversário de chIco (70 anos, completados 






dia 19, depois de amanhã), que aprecia como ninguém um futebol, um carnaval, uma cerveja, e uma 

mulher bonita (do modo mais respeitoso que possa haver, porque através da poesia), 

e que ajudou a construir, a seu jeito, a vitória de luLa, devemos a ele dedicar a vitóriA 
no jogo de hoje :: 

seus samBas são populaRes, já estiveRam na boca da massa, e somenTe não estão 
mais porque tudo aquilo que 

é de uma beleza indescritível - como a popularização de um requintE rítmico-filosófico, 
caso de toda a Música Popular Brasileira, a MPB -
é por natureza uma evanescência, algo que logo desaparece :: será que nosso bRasil bonito, 
o mais lindo que
houve, aquele da década de 70, vai voltar, vai ressuscitAr como cRisto, para com o apoio dos eStados uNidos, cumprir o destino do 

nOvo Mundo, a aMérica, e ajudar a refundar a veLha euRopa, ou seja, o oCidente e 

toda a cristandade helêniCa? :: as condições estão dadas, pois se não existem hoje torturadores físicos, nem sensores 

ideológicos, temos esse imenso lixo acumulado desde a década de 80, com a transformação da favela 

em zona cruel de guerra e, sobretudo, com o achincalhamentO pela mídia de nossos valores estéticos, antes tão duramente 

conquistados, pois resulTado da fusão sangrenta dos gostos e paladares de 
todas as nosSas etniAs ::
a ditadura, a defendEr o conservadoriSmo frente à essência dionísica do bRasil, hoje não 
é militar, mas terrivelmente civil ::
e elA fornece o antagonismo necessário, sempre necessário, ao resplendor e à vitória da beleza :: e o cálice da bebida 

amarga, que chiCo e milton nascimento pediram para recusar nos anos 70, é serviDo 
hoje com a ajuda implacável da internet, por meio de uma
recusa da nação, em discursos extremistas, que muito mais facilmente conquistam o gosto do poVo :: extremismo, espírito de 

porco e chauvinista, servido e sorvido a largos goles pelo grosso da população, em todas as suas camadas :: nossas 

redes sociais, apesar de representarem uma conquista democrática, paradoxalmente 
vêm funcionando
como um criatório de ratos, monstros, terríveis moscas varejeiras, que zombam daquilo 
que representa, acima de 

tudo, uma conquista para a humanidade, ou seja, a brasilidade :: sendo que tal força negativa 
atinge de maneira preocupante 

até mesmo a qualidade de nosso futebol :: alemanhA e holanda já se apresentaram como 
adversárioS mais do que forTes, 

requerendo que, mais do que nunca, o bRasil seja o que ele é :: a disputa nas ruas, com 
o extremismo de esquerDa, acirra 

os ódios, e antecipa a disputa eleitoral de outubro, irracionalizando ainda mais esse particular 
momento da nação :: todas as condições estão 

dadas para que nosso inconsciente coletivo, que sempre deseja o bem, passe a formular 
uma solução mágica para nossos problemas
aparentemente irresolvíveis, e que surgirá com a beleza de um chute a gol :: sonhemos, 
e com razão



e legitimidade, para que nossa incrível capacidade de amar a brincadeiRa volTe a conquisTar a bolA e o munDo :: e que 

nos tornemos grávidos de ilusão, e que os herois do hexa, ilustrando comerciais de bancos, 

mineradoras, grandes companhias do capitalismo mundial, invadam, com a bondade que representam, o coração do 

sistema opressor - necessariamente opressor, deve-se dizer :: toda a opressão que sofremos da sociedade organizada em regras 

e leis rígidas que objetivam produzir dor, lucro, trabalho, é tragicamente vital para o equilíbrio da existÊncia :: isso 

porque os instintos de prazer e amorosidade do ser humano não podem ser deixados a sós (algo que nossos socialistas 

libertários, com todo respeito, ainda não conseguiram entender)):: antes, nossos instintos precisam de uma 

educação, de uma guerra entre a natureza e a cultura :: e essa é a grande lição do mito, da luta entre o bem e o mal, onde ambos se fundem, 

amam-se e odeiam-se, um buscando e gerando o outro :: desse confronto no mundo dos instintos 

é que vêm as carrancas que se degladiam nesse momento, sobre a superfície da realidade :: a

opressão é inevitável, para que o amor sempre renasça, como uma flor brotando do asfalto, na clássica imagem de 

carlos drummond de andrade :: falta a nossa esquerda compreender melhor essa noção, transcender seu marxismo 

corroído, gerando nova quimera ideológico-existencial, de cunho cada vez mais luso-tropical-brasileiro :: 

falta uma nova inteligência brasileiRa, como aquela que cercava lula e chiCo buarque, 30 anos atrás, capaz de 

nos redimir de toda essa dor :: nesse jogo, esquerda e direita são fundamentais, orquestrando o orgulho da nação :: não deve-se esperar a 








revolução capaz de, abruptamente, trazer o paraíso na terra, como nas velhas utopias libertadoras - burguesa ou socialista - da 

euroPa, :: o pensamento mudou :: deve-se investir em nova apreensão do modo como nos tornamos a cada dia mais humanos, em meio a 

lutas intermináveis, porém de modo cada vez mais cordial, conforme reza o mito da brasilidade:: e que o império do mundo 

do dinheiro, da machismo, do preconceito, da falsidade - que existe tanto de um lado como de outro, tanto 

à esquerda como à direita - deixe-se aos poucos contaminar pelas difíceis lições do tornar-se homem e 

menino ao mesmo tempo, em uma só palavra, heroicamente brasileiro, para que um
dia, até mesmo 

essa designação, que identifica um credo, uma raça, uma ideologia, um país, deixe 
de existir e, portanto, oprimir ::
mas esse já será outro capítulo dessa nossa venturosa históRia :><



"Voltadas antes de tudo para si mesmas, esporte e arte são esferas da vida que negam o utilitarismo dominante, e, por isso mesmo, promovem um efeito de pausa, feriado, ou descontinuidade com a sofreguidão exigida pela lógica do lucro, do trabalho e do êxito a todo custo. Se o objetivo do trabalho é enriquecer a sociedade, transformando-a em corpo poderoso, o alvo do esporte é muito mais difícil de estabelecer. Tudo indica que o esporte tem um lado instrumental ou prático que permite "fazer" coisas e promover riqueza; mas ele também tem um enorme eixo expressivo e/ou simbólico que apenas diz e, como os rituais, revela quem somos." roberTo damAtta, notas em torno do significado do futeBol brasileiro ::



repenSar o mito bRasileiro, que engloBa o poder do futeBol como mística coleTiva unifcadora, envolve considerar essa colocação de roberto daMatta :: se o futebol é a nossa cara e diz sobre nós, então somos na essÊncia brincadores dionisíAcos, em contraste bastante acentuado em relação aos esTados uniDos :: nessa américa de diferentes mistuRas, a alma norte-americana certamentE se revela na oposição ao eixo dionisíAco bRAsileiro através do poderoso direcionamento coletivo rumo à produção econômiCA :: novas loucuRas, certamente, despertarão nosso lado dionisíAco atualMEnte talvez algo inativo, para avançArmos em direção a uma maioriDAde do bRAsil enquanto pátriA espirituAl ::

domingo, 15 de junho de 2014

++ as lições da coPa e da faveLa ::

Naif de Helena dos Santos Coelho



ao final, ao se confirmar a realização da coPa ((está tendo coPa)), confirma-se a
função semprE agregadora

da favela, real sítio gerador da capacidade brasileira futebolística :: prevalece
entre nós, por mais divisões

sociais que ocorram no país, o gosto do povo, o gosto do negro, o gosto do pobre ::
gilberto frEyre realizou-se como

teórico do bRasil ao analisar o gosto do senhoR branco pela negra escraVa :: a
importÂncia, na construção

de nossa cultura, da disponibilidade de 30 índias para cada bandeirante paulista :: o
bRAsil é dificilmente compreendido em razão desta surpreendente

concessão que se faz ao povo, de origem erótico-instintiva, que produziu a sacralização
do prazer carnal,

na concretização de uma etnia misicigenada :: o elemento branco europeu rendido pelas formas encantadoras,

exóticas, saborosas :: em nenhum outro lugar do mundo aproveitou-se tão bem da
contribuição calorosa do estrato

massacrado, profundamente inferiorizado da população, para se constituir a característica
da nação, os traços identificadores

das maneiras de fazer, casar, pensar, aprender :: no bRasil que é verdadeiramente brasileiro,
tudo é profundamente

popular, advindo desse complexo sistema sócio-afetivo a comum raiva que sentimos por
nós mesmos ::

existe o comando de uma sabedoria da pobreza - da favela, do nordeste, do genocídio
na floresta - que somente se afirma

mediante a crueldade de uma elite empertigada e invencível :: existe uma marcha
gloriosa, mansa e incansável,

em nome da libertação desse pobre povo :: na atual encruzilhada identitária em
que nos encontramos, em que a elite volta-se

novamente contra a favela, e com a adesão geral, agora, do povo à coPa, após o levante
popular de junho do ano passado, reafirma-se nossa

identidade "maloqueira" :: a prevalência é da festa e do futebol :: ninguém ousa negar
o apelo irresistível

do prazer, do mesmo modo que os senhores de engenho, no passado, não ousavam
negar a fácil

e irresistível possibilidade da curra de suas escravas :: sobre essa indecência, tão difícil
de ser compreendida

como o é a inteligibilidade do inconsciente humano e suas inversões sígnicas e de sentido,
formulamos a difícil pátria calorosa, que a tantos escandaliza ::

como soube formular tão bem a psicanálise, no início do século passado, derrubando
vários tabus sobre a moralidade e os costumes rígidos

ditados pelas religiões, o prazer é a razão da essÊncia humana, e a ele nos devotamos,
custe o que custar,

em busca do carinho, da união e do amor :: o bRAsil é o fim de um suplício, perpetrado
por uma cristandade

corajosa - o fim da crença de que o paraíso somente se alcança pelo trabalho e
o sofrimento, depois da morte ::

o bRasil é a possibilidade real do prazer sem culpa, e as orgias que aqui se
estabeleceram, por mais cruéis que estejam sendo,

querem dar a prova ao mundo de que a alegria terrena, vivida na praia, no futebol,
no samba, na sensualidade,

nos instrui sobre a possibilidade de um novo modo de controlar nossos instintos de
guerra :: o rendimento,

mais uma vez, do conjunto da população frente ao misterioso encanto vadio produzido
pelo futebol

está reafirmando nossa viabilidade enquanto pátria, está melhorando a ideia que o
conjunto da humanidade pode

ter sobre as possibilidades de se construir uma sociedade mais pacífica, por intermédio
dos laços culturais ::

se o brAsil é possível e funciona - a despeito da tão difamada desorganização estrutural,
sempre a gerar o

contraste aparentemente vexatório com o resto do mundo, especialmente o mundo
branco europeu - então é porque o ser humano pode ser feliz na terra ::

ou seja, trata-se de uma solução filosófica há muito esperada, considerado-se a
encruzilhada em que

se encontra a civilização mundial moderna :: de modo mais certeiro, devemos pensar
que a felicidade

terrena aqui encontrada é mais viável do que aquela norte-americana, onde o prazer
legítimo da vida

vem sustentado pelo consumo irrefreado dos cidadãos, custando milhões de dólares
em armamentos,

na defesa imperial de um modo de vida que é, de modo perigoso e capital, ambientalmente
insustentável :: na singeleza

da alegria brasileira, na aparente pobreza "maloqueira", sílvicola e agreste de suas
soluções para a felicidade terrena,

é que se pode basear a esperança de uma nova crença para o mundo civilizado :: a
coPa, que acontece,

vem acontecendo, e não deixará de acontecer até o fim, porta essa lição, fornece
esse aprendizado ::

creio que cabe aos que se preocupam com o futuro do ser humano a ser vivido em
comunidade, em um planeta

fisicamente limitado, absorver tais conhecimentos e transformá-los em energia útil e
animadora para os

anos vindouros :: e que se dissipe ao menos um pouco o denso nevoeiro que sempre
teimou, e continuará teimando, em confundir

o futuro da nação com noções obscuras e preconceituosas sobre a possibilidade de
um país miscigenado

representar um modelo frutífero de cultura e sociedade ::><





"O que houve no Brasil - cumpre mais uma vez acentuar com relação às negras e mulatas, ainda com maior ênfase do que com relação às índias e mamelucas - foi a degradação das raças atrasadas pelo domínio da adiantada. Esta desde o princípio reduziu os indígenas ao cativeiro e à prostituição. Entre brancos e mulheres de cor estabeleceram-se relações de vencedores com vencidos - sempre perigosas para moralidade sexual." 

<>gilbErto freyRe, casa gRande & senzalA >< capítulo V  ++inclUído em 12 abr 2020 , domingo de páscoA, em que, devido à pandemia da coVid-9, a gloBo reprisa a final da coPa de 2002, já que a temPorada normal do fuTebol encontrA-se suspenSa :..:

quinta-feira, 12 de junho de 2014

++ dois textos sobre a copa ((primeiro




as copas do mundo são como o possível efeito de uma invasão extraterrestre,
a chegada dos marcianos

à terra, ou algo assim, conforme uma imaginação que nunca nos abandonou ((
seriam os deuses,

astronautas? :: a imaginação futebolística atual desenha nossos ídolos como
verdadeiras figuras

míticas, guerreiros que sinuosamente furam a defesa inimiga :: nossos heróis
épicos, como foram

aquiles, ou uLisses, na tradição européia :: o brAsil brinca ainda mais com
essA possibilidade,

gerando, a partiR de garrinCha, mais especificamente, a docilidade do
desconcerto driblador ::

pequenas sinuosidades na condução do passo confundem completamente o
adversário :: as matreirices

de garrinchA nitidamente evocam o saber indígena-africano ((caboclo, para
dizer em uma só palavra))

tão fortemente ritualizado na arte da capoeiRa :: dizendo de outra forma - nossa
suprema malandragem

está em vencer sem destruir, o que em nada se relaciona com
corrupção :: mas o bRasil é mesmo um

enigma, e sua suprema realização como pátria da boLa - ainda o é - repercute
todo um imenso acúmulo

de conhecimento mundial em busca da paz :: as funções da bola são
as mesmas das antigas correrias

e invasões, de quando a cobiça sobre as posses do inimigo não se continha, e se
praticava com maiores limites a luta,

a guerra, a discórdia, a pilhagem, a escravização :: ainda somos os velhos
homens humanos, precisando acertar contas em torno

dos modos de produzir beleza e satisfação no dia-a-dia, cada nação para
seu povo - e por isso a guerra :: no mais íntimo

de todo esse imaginário, está a conquista dos olhares femininos, pomo maior
da discórdia entre

os próprios deuses, como narram as lendas de hOMero :: vamos roubar heLena,
querem dizer os

soldados (minto, os jogadores), quando adentram a área adversária :: o pavor
de nossa masculinidade,

hoje, no bRasil, é o bretão (fantasiado de portuguÊs) cristiAno ronAldo :: seu charme
e sua inteligência

futebolística são capazes de conduzir nossos garotos à imitação do grande guerreiRo ::
por isso, nessa

forma pacifista de se manter o ardor das conquistas, é o bRasil que se destaca,
país cordial e bonito

por artes da produção cabocla, ou, diga-se, miscigenada :: mulheres gostam da inocência
infantil

de meninos, porque sabem que encontram ali a garantia de uma boa guerra :: sabem
que, no decorrer

das batalhas, seus homens apenas terão cumprido a missão de marcar a
diferença, a dignidade e a honra, em nome dos valores

imperiais de nossa terra, sem desmontar a casa do adversário, queimar suas
plantações, envenenar

seus depósitos de água e, especialmente ((eis, novamente, o pomo da
discórdia), sem encantarem-se

pelas mulheres estrangeiras :: ou melhor, sabem que esse encantamento será inevitável ::
mas, enquanto esperam

pela volta de seus soldados, tramam mil feitiços para recuperá-los enquanto inocentes,
como se fossem lindos

e mimados bebezinhos, as crianças puras e delicadas, que na verdade são, de volta
ao colo de suas

amadas e mães :: todo o horror e a beleza dessas emanações míticas, que crescem
como vegetação,

espalhando culturas e nacionalidades, a partir do coração do mundo oCidental, bíblico
e homérico,

nos obriga a confraternizar, a carnavalizar





:: é a eUropa perseguindo seu curso civilizador, impondo

suas matrizes ao mundo, porém já de modo amistoso, dionisíaco, como também no
caso do cinema hollywoodiano, ou da cultura pop ::

hoje, quando iniciarem-se os festejos da maior folia mundial que a humanidade já
foi capaz de produzir, em uníssono, tudo isso estará querendo

dizer que os ecos do antigo mito do ocidente se ampliam e encontram sua
linguagem contemporânea ::

por isso, o futebol é na atualidade a língua comum da humanidade, um exemplo, um
espetáculo sobre

como forjar a comunicação das diferenças, da maneira mais popular possível ::  é uma
pílula contra

o nazismo e outras possibilidades totalitárias ::  e, dentro dissO, deve-se sempre
salientar, o bRasil é mestre ::

que vença o futebol mais menino, em nome da paz universal :: nem buda nem jesus
a trouxeram ::

nem maomé, nem os ícones anímicos guerreiros das nações xamânicas espalhadas
pelo planeta inteiro

(aborígenes negros, indígenas etc.) :: quem a traz é um campo de disputas, em torno
do qual se multiplicam

sonhos de amor, beleza e amizade ((de rivalidade amiga, como se poderia dizer)) ::
é, no íntimo,

um amor sagrado da mãe por suas crianças indefesas frente aos múltiplos perigos da
vida :: quero

crer que a metáfora da invasão alienígena - único fato hipoteticamente capaz de captar
a atenção mundial irrestrita - é inteiramente

válida como metáfora para a audiência conquistada pelo campeonato mundial de
futebol, viabilizada especialmente por

meio da tecnologia de comunicação, cada vez mais incrivelmente integradora de
todas as sensibilidades humanas ::

no caso da coPa, todas as cultuRas querem saber de quem será a fama da vitória,
todos querem conquistar essa

vitóriA :: lembremo-nos  da nova alegria que o futebol nos proporciona, mesmo
que seja a de uma paz efêmera, mesmo

que seja em meio a tantas cruezas do cotidiano mundo globalizado :: essa alegria é
desproporcional aos nossos problemas ::

a vida real do mundo capitalista, nesse início de século, nos diz que caminhamos
para uma catástrofe ecológica planetária ::

as chances de novas disputas territoriais se acentuam :: e o ser humano é uma máquina
de odiar e matar, caso não tenha

suas necessidades essenciais bem atendidas :: em razão disso mesmo, venho me
perguntando seguidamente

que energia é essa, a do futebol, que a todos conquista :: ora, é o sonho da bola e
da vitória inocente,

em nome de uma ternura feminina eternamente buscada :: e essa lenda vem de uma
outra dimensão, vem do imaginário coletivo, que coexiste

com a realidade como se fosse uma estrela ou um satélite em relação à terra
(um sol e uma lua),

nos iluminando, aquecendo ou orientando de longe, exercendo misteriosas funções em
torno de nossa

navegação infinita no espaço :: sinto que, com a coPa, todos os mitos da pacificação
nos acompanham e

nos iludem :: as luzes se acendem, prometendo vida nova :: repito - são os velhos
homens humanos

:: é todo nosso inconsciente coletivo produzindo o artifício vital da renovação da
esperança :: é uma chegada,

uma natividade, um advento :: nessas horas, ser brasileiro é sentir que, a par de
todos os nossos problemas,

puxamos o carro da energia mítica que entrega o mundo mais sincero e inocente
a si mesmo, e, paradoxalmente,

mais adulto :: acreditar que uma aparente bobagem como o futebol pode salvar
o homem de si próprio,

produzindo o triunfo do bem sobre o mal, é ser como nietzsche sonhou, é estar
por um fio, sem falsas ilusões,

respondendo com arte, e sobretudo com arte, aos desafios da existência :: nisso,
o brAsil é o campeão

dos campeões ::  e, pode-se dizer, com o mesmo senso de imaginação e aventura
espiritual, que seguramente somos

vencedores mundiais - que sem sombra de dúvida lideramos a humanidadE ::