sábado, 11 de outubro de 2014

visãO




"Agora o braço não é mais o braço erguido num grito de gol. Agora o braço é uma linha, um traço, um rastro espelhado e brilhante. E todas as figuras são assim: desenhos de luz, agrupamentos de pontos, de partículas, um quadro de impulsos, um processamento de sinais. E assim - dizem - recontam a vida. Agora retiram de mim a cobertura de carne, escorrem todo o sangue, afinam os ossos em fios luminosos e aí estou pelo salão, pelas casas, pelas cidades, parecida comigo. Um rascunho, uma forma nebulosa feita de luz e sombra como uma estrela. Agora eu sou uma estrela."  ((poema de fernandO faro, recitado por eLIs regina em seu último show, "Trem Azul" ::


na praça tiradentes, ouro preto, minas geraes, renovam-se os votos de um
armistício :: ouço o cortejo

que leva o sonho dourado do bRasil, bem representado pelo amarelo ouro
da bandeira, bem guardado,

só podendo ser tocado por luvas imperiais, ouvidos que a natureza apurou,
como um concerto

sinfônico :: se fossemos ouvi-la, a musa, costurando nossa bandeira, veríamos
os inúmeros soldados,

levando para a confissão, o mito amarrado, o alferes, em sonho, crucificado ::
fica em paz com a tua

bandeira, ó mulato, que o sonho nos leva :: agora, já vejo bem, há um novo
cortejo de crucificação ::

que nos leva, como cortejo, de novo amarrado, em sonho :: esse é um bRasil que
se tece em torno de si mesmo,

consegue completar a volta :: o bandeirante transtornado pela doçura do
paraíso :: nossos vastos

medos :: a mulher que  cavalga são nossos medos :: nossos mitos :: tancredo
neves :: ayrton senna :: mãe janaina :: conseguimos

revelar o espírito humano em toda sua beatitude, como quase conseguiu são
francisco :: irmão pai,

irmã lua :: novas armas imperiais sossegam o espírito humano, já conseguimos ver
o futuro :: a linda

inconfidência, confluência do deus imaginado, o brasil tão longe, apenas imaginado,
como futuros múltiplos

e bem amarrados, costurados, numa refazenda latina, vistos com bons olhos de pássaro,
aos quais se ofertam

flores, e muito sangue, beberagem madura de xamã e telas de antônio poteiro ::
múltiplos meninos saem como olhos em telas de denso

ardor :: caem, quebram a cabeça nas pedras da avenida central, praça tiradentes,
ouro velho,


manhas de escravo, magia que cose a postura altiva do marinheiro, malandro,
cantador, escravo ::

deveríamos pensar nos algozes e sua função, nossa vilania geral, a vila boa do
remédio oriental :: a mais cristã de todas as pátrias será

aquela que sofrer e se oferece no maior de todos os sacrifícios :: na cruz, o medo
foi vencido :: o medo se transforma,

em bandeiras e harmonias de jazz, esmolas no sinaleiro, improviso mambembe
de repórter fuleiro ::

guitarras e mímicas :: mijadas alegres e festivas, animando o pasto alegre :: o menino
correndo

com a paz entre os braços :: a paz prometida, a paz do espírito trágico, a paz do
úNico, a paz do primeiro

passo :: o braço alegre, a poesia, o jeitão de mago, capaz de converter diabo em
cristo, e o cristo em

diabo, sem que ninguém perceba :: alegria curumim :: o deus da mata virgem, e
gilberto gil :: já vejo o mito de novo chegando,

e arrebanhando seus vozerios :: algo precisa morrer!, gritam os soldados, imponentes ::
solos de guitarra,

ouvem-se, são gemidos, violinos arrebantando as cordas, são os tinos cordiais da
cordura insustentável

de menino :: a cada vez que o bRasil morre, como agora, no picadeiro, com uma
bala na cabeça, ou no peito, há um tanto de gente inumana

que fica bem contente, o cérebro restabelecido, no contato com sua imaginação primitiva sanguinolenta ::

amarra-se o menino :: que seja enforcado com os cadarços do tÊnis da morte, a
R$ 500 reais o calço,



na batida do funk :: o começo de tudo na latrina da favela :: bata-se, bata-se,
bata-se :: o bRasil morre ::

bata-se, bata-se, bata-se :: o bRasil morre, mais uma vez :: o bRasil morre :: mais
uma vez :: desse ruído de morte,

entre feras absurdas e noturas, desponta a aurora, fantasia do nordeste :: agora se fizeram
ruir todas

os atabaques e chocalhos da naÇão :: por sermos a classe média, pensam os algozes,
nossos carros

originais intuem uma beleza menos candente :: nossas suítes querem o sexo à
vontade da corrupção ::

querem o mar de soldados vendendo veneno, agrotóxico, sujeira, imundície,
xuxa :: querem o tempo único da vida,

peitos de silicone, vícios de cocaína, pensamentos nada bons, que sempre
intuem um puteiro

grande, enorme :: estão todas elas ali, as enforcadinhas, meninas africanas, bem
negrinhas, índias com a raspada

vagina, um colar de contas na virília, o ventre liso, um casamento rápido e
servil :: bRasil, a pátRia corroída :: em 500 anos

de nossa aventura, um canto de asa quebRada, uma inumana violação :: a dor se
ergue encapsulada, capsulas de beleza e imaginação

concentradas :: nosso suor :: eácio se ergue com as palomas da morte :: junto com
ele estão os mantras

da concentração explosiva, o genocídio cultural e guarani :: como as escravas que
se despiam e ficavam nuas para o

41. senhor :: senhor, seu falo é sua metralhadora, meu senhor,  é o fim último de
seu regulamento:: pronto,

novamente a pátria está fodida e os címbalos da vida cingem de ouro os ouvidos
da noiva da morte ::

acabe-se, asfalte-se :: da pátria escorre sangue, que fertiliza o solo :: na dor da
praça tiradentes,

úmidas plantinhas se intumescem :: são os olhos de nossos mestres, são a
poeira estelar agreste

do infinito :: concentram tesão e gelo :: cortam e ritualizam :: logo, a marcha fará
recomeçar a brotação

leve de uma fina camada artista, continuando o sonho breve e fugaz sob a lona do
circo que sonhou elis regina ::





domingo, 5 de outubro de 2014

o títulO




a colheita complexa das intenções, em uma eleição, é ao mesmo
tempo simples, como no trabalho

das abelhas na colmeia :: a razão única, maior, muitas vezes incompreendida,
ou muda, (porque

inconsciente), é o medo da desunião :: nisso, a complexa simplicidade :: é o medo
que temos, sempre forte e latejante, embora sutil, de que a sociedade

se transforme em brutalidades atrozes advindas da natureza conflitiva do ser
humano :: é por conta de um sossegamento

desse medo que todas as abelhas/pessoas trabalham, independentemente das
posições sociais que assumem, de classe, cor, gênero, religião ::

nossa forma artística regional brasilEira é o resulTado dessa união prática e
unicamente pictórica, que vive

apenas como mito :: ela prevalece, sempre, alegre e matreiRa, mesmo que a superfície
da realidade se cubra dos mais severos episódios de violência,

das mais derradeiras e difíceis bandeiras de superação da diferença :: ela é o menino
alegre que joga

bola na favela :: ela é o assaltante de banco que posta sua foto na internet ::  na desunião
radica o medO óbvio

e fundante de não possuirmos amoR :: e é a esse complexo de amor/medo/desunião
que se deve atribuir a origem

da fabricação do mais puro mel da colmeia, nosso artefato mítico usado para a
costura permanente

e a deflagração da alma brasileira, vista por outros países como suficientemente
ameaçadora a ponto

de mantermos nossa sabedoria soberana, enquanto brasileiros :: o bRasil foi um país,
basicamente, conflagrado, em seus 500 e poucos anos de história,

seguindo um destino de luta encarniçada por independência :: na morte de
tanCredo se teria

encerrado um ciclo heroico de sucessões e assassinatos :: mas ainda
houve collOr, para

não deixar dúvidas quanto À existência dos severos deusEs e demônios que,
assustadores, mas

ao mesmo tempo inofensivos, tomam contA da alma nacionaL :: depois disso, a
democracia assentou, e a velha direiTa passou a mais ou

menos respeitar as regras do jogo :: mas sempre comandada por um ímpeto
do tornar nosso povo um gemido

lancinante de dor, como no caos que impera por meio dos comandos da
corrupção, do crime organizado

e do genocídio organizado nas periferias :: somos uma forma de nave que
navega longínqua  no tempo, navio negreiro

mar adentro, comandado, como não poderia deixar de ser, pelo medo :: mas
esse medo, como se

falou acima, é salutar, porque gera ao mesmo tempo alegria :: há uma graça
no combate :: há uma alegria que é parte

integrante da diferença :: fico daqui apenas admirando esse movimento
ancestral, que se torna

cada vez mais limpo de sangue :: cada vez mais dando oportunidade - devido à
superação da guerra





como violência física - ao mito da mulher também combatente :: e eis que se chega
ao ponto máximo do rito de

nossa organização social, que prenuncia o valor de uma pátria conduzida pelos
valores sagrados do

feminino :: sagrados porque tidos como universais, sem implicar,
necessariamente, em uma existência

religiosa para esses valores :: mesmo que mariNa silva não passe ao
segundo turnO, essas eleições já se apresentaram como as

em que um maior número de mulheres efetivamente assumiram posições
de destaque :: e isso é tão virtuoso para a

democracia brasileira quanto já termos entronado um líder trabalhador
do povo, em uma nação desde

a medula comandada por ferozes oligarcas escravagistas, verdadeiros
coronelões imperiais ::

a vida, de certo modo, imita não apenas a arte, como também a natureza ::
e será que

não já estaremos chegando, também, à sabedoria das abelhaS, tornando
mais visível

o esforço coletivo em prol do sentido de proteção máxima que apenas
a rainha mãe,

ou seja, a abelha rainha, consegue transmitir a todos, sem distinções? ::
ela, que nos transmite um

esforço apenas demonstrativo, baseado no simples exemplo da maternidade,
sem qualquer

tipo de imposição pela força física violenta? :: peço desculpa aos machões
de sempre, mas,

sem dúvidas, esse é o significado evidente do grande momento histórico
pelo qual estamos passando ::

uma ascensão do feminino, provavelmente sem chance alguma de recuo ::
pois, desta ascensão

será proveniente um mel, cujo sabor, inigualável, será impossível
esquecer :: e é em

torno desse resultado de satisfação humana primordial que nos organizamos,
desde

sempre, mesmo sem saber :: peço desculpas aos que não conseguem ver
sentido no

que estou falando, e que se julgam apenas guerreiros
nessa

batalha, orienTados por interesses mais imediatos, pessoais, ideológicos,
econômicos, acadêmicos :: preocupados

apenas em saber o que vai fazer dilma, ou o que vai representar o
governo aécio ::

mas estou ficando já farto dessa falta de habilidade de interpretar
o bRasil ::

o bRasil é muito mais do que simplesmente isso, é muito mais do que
um simples resultado

econômico ou a simples luta de classes :: o bRasil é um poema aberto ::
para ser interpretado,

o bRasil requer muita calma e paciência, como no caso explícito dos
dengos baianos que nos fundaram como

cultura moderna, fincada na malemolência ((hoje tão combatida :: como
no caso do arquétipo

da mãe original lavadeira nordestina, que, mesmo calma e contrita, espalha
nervosamente seu medo,

qual geração de energia elétrica, enquanto bate com as roupas lavadas da
família inteira nas pedras de um lajedo,

em um córrego de água limpa, atemorizando calmamente a tudo e a todos ::
aquilo que

não se vê a poesia se encarrega de mostrar :: estamos
grávidos

de humanidade, e o bRasil gerador de um humano simples prevalece
em seu mito, como no

dia de hoje, quando milhões irão às urnAs, ostentando bandeiras de até
mesmo ódio, mas unidos

pela complexa cera que mantém unidas as partes da colmeia :: estamos
em guerra pelo amoR ::

 estamos em guerra pelo menino e o nascimento da esperanÇa ::