quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

"com açúcar, com afetO" ((ou, sobre o poderoso miTo da mulher ::>>

(por e parA sílviA


><><><><><><><><><><><><><><><><><><><><>


nego uma forma de vida pensante que não retire sua força de si mesma :: olho, e nunca vejo outra coisa que não seja - a mulher ::

possuo quarenta e dois anos de existência, que correspondem a uma existência de amar o feminino ::  quando nasci, o "anjo torto"

a me visitar ordenou-me tal vaticínio :: todo o mistério de transcendÊncia do humano, não importa qual mitologia, forma-se a partir dessa busca

pelo feminino :: nada é tão forte e restritivo, nada é como essa bruma >> leva-se tempo para compreender tais coisas :: cada espírito amadurecido, ao fim e ao cabo, no

entanto, vai se deparar com essa "borboleta", um misto de beleza com efemeridade, ao procurar a razão última das coisas :: quente mistério que me ilumina,

brotado de uma grota geral que fortalece o evoluir secreto, sempre recôndito, de um regurgitar do medo
em esperança,

de uma expressão do mal sob a forma de boas e ternas leituras do mundo :: penetrei
docemente

nesse túnel que faz o tempo, pois que é da mulher o controle sobre o falo, e todo o controle que esse
falo exerce sobre o mundo :: nada é tão monstruoso, por consequência, tamanho o poder ::

se perdemos o fôlego diante da cultura que domina, e sufoca como uma planta que não para de lançar ramos, até que tudo esteja coberto,

em um processo imenso de proliferação ou mesmo infestação, é porque já estamos diante dessa própria imensidão do feminino ::

não quero pensar em outros arquétipos que não seja o do útero, pois seria negar o que vejo :: não quero erguer nada

contra o útero, pois estou absolutamente convencido de sua invencibilidade :: como os homens, sem destino,

vão orientar-se? ora, o grande cogito é o do falo :: toda destruição perpretada provém do falo, e de sua atração

irreprimível com relação ao útero, aonde quer ir sonhar, aproximando-se da casa liberta, e do colo quente da moça,

que com suas lágrimas a escorrerem pela face límpida e harmoniosa pensa no sacrifício, no trabalho, e no crescimento perseverante ::

tudo o que foi Lutero, sua força que proporcionou o atual século, de milagres e desastres, vem dessa docilidade destrutiva e inocente ::

tudo o que gerou o Ocidente :: dói receber a dura informação :: dói amar o que nunca está satisfeito com o que somos, essa negra mãe obscura

e atordoadora, que lança doenças para que o pai busque curas :: tenho 42 anos e uma tontura que me faz menino, sempre um tenro broto,

a ser provocada pelo carinho que emana das formas bonitas e apaziguadoras :: sou um devoto de uma santa, com aspecto de cadela ><

sou o reformado, e que aceita ir para a cadeia , para uma artística cela, sonhando em personificar o milagre essencial do equilíbrio,

que faltou a Édipo :: como domar o instinto perverso do masculino, que, diante de tanta delicada beleza, sem se dar por conta

de si, comete repelências, que condenam toda a cidade? como depurar o medo violento sem o qual não conseguimos gerar o futuro?

posicionando-se como bebês informes, a receber um carinho essencial da mãe :: sinto que tudo que sonho, que meu projeto benfazejo,

sofrendo sempre do encosto de um sonho de perversidade contra a perfeição do feminino, depende dessa postura, como se

eu fosse o brando leão que sonha a cidade :: para ser forte, e inspirar vontade, vontade intensa de mudança, que irá se processar sobre as formas

gastas do viver, é preciso alcançar a torre de uma inocência :: nela, todas as mães passam a mão sobre minha cabeça,

me socorrem, expandem meu intelecto :: posso retornar então ao país que eu como com minha fome de conhecimento, o bRAsil :

as mães  pedem perdão pelo meu sofrimenTo :: sou o pequeno suave outono do grave desejo, e trágico :
se gaston bachelard fosse vivo, me colocaria no colo, e meu segredo... meu segredo encontra-se no sexo
puro, e na voragem sexual de violência contida
no orgasmo branco, nas santas formas, na tolerância para com o humano erro sem que se perdoe, no
entanto, sua bruta literatura,
sua leitura e escrita passíveis de revisão em nome da cordura ::

há sempre um possível trabalho, e uma aresta, e o sangue precisará ser conduzido por todos os vasos,
para que os olhos vejam, e o coração sinta, e prossigamos nesse processo de tornar a besta humana menos

crua ::
por isso, por mais difícil que pareça, inútil e de fraqueza aparentemente demonstrada, somente a arte é que

possibilita o progresso, a evolução,
é ela o ritmo arcaico que sustenta a própria tecnologia :: sou um cão, que abraça o mundo como alguém à

procura de um instante naquele colo quente,
aquele afago bondoso, consciente da fragilidade desse íntimo contato com a mãe, consciente do Édipo que me guia em direção

à dor dos olhos furados :: sou o novo Paulo Freire, reforçado em sua docilidade roubada de um incesto com a natureza,

piedoso a ponto de ver o próprio etnocídio cultural brasileiro como promessA





O bori teve início à noite. Vestidos de branco, os noviços sentaram numa esteira com as pernas estendidas e mãos abertas sobre as pernas, palmas viradas para cima. Atrás de cada um estava a pessoa escolhida como sua madrinha ou padrinho de bori. Começados os cantos, padrinhos e madrinhas puseram-se a lavar as cabeças de seus afilhados, derramando sobre elas uma infusão de folhas frescas e cheirosas – o amaci. Então se posicionaram na frente destes, segurando uma bacia esmaltada – chamada de ibá ori (bacia da cabeça) - que é o duplo do ori no outro mundo (orum). Uma tigela grande com fatias de frutas foi trazida. A mãe de santo retirou duas fatias e as movimentou ao redor do corpo da primeira noviça, antes de colocá-las dentro da bacia. A mesma operação foi repetida para cada um dos noviços e com diferentes comidas – além das frutas, pratinhos com bolinhos de inhame, bolinhos de arroz e grãos diversos. Antes de ter seu conteúdo despejado no ibá ori, cada pratinho circulou ao redor do corpo do noviço, marcando as direções de frente e trás, acima (cabeça) e abaixo (pés), direita e esquerda6 . Quando toda a comida foi coletada nas bacias do ori, estas foram deixadas sobre o colo dos noviços. Os padrinhos e madrinhas trouxeram, então, quartinhas com água e pratinhos de barro contendo obi (um para cada noviço). A mãe de santo aproximou-se da primeira noviça do grupo, pegou o obi e cortou algumas fatias finas. O restante ela dividiu em duas partes, sobre as quais aspergiu um pouco de água da quartinha, antes de lançá-las sobre o prato, para assegurar-se de que a oferenda foi aceita pelo ori7 . A mãe de santo entregou, então, uma fatia do obi `a noviça para que mastigasse sem engolir, ela e a madrinha fizeram o mesmo. Depois recolheu os obis mascados, que foram cuspidos em sua mão, e pôs a pasta sobre o cocuruto da noviça. Notei que alguns noviços contraiam as feições com o gosto amargo do obi. Enquanto repetia a mesma operação para cada noviço, a mãe de santo dizia: “Obi paz, obi calma, obi tranquilidade”. Outros ingredientes foram agregados à pasta de obi sobre as cabeças, entre elas uma porção de milho branco cozido. Neste momento foram trazidos os pombos para serem sacrificados e oferecidos ao ori (um para cada noviço). Um pouco do sangue do pombo foi derramado sobre vários pontos do corpo, seguindo as direções já mencionadas: pés,

pulsos, cocuruto, têmporas direita e esquerda, nuca e ombros. Penas foram fixadas, com o sangue, em alguns destes pontos. O sangue foi também derramado sobre o ibá ori. Penas dos pombos foram colocadas em torno desta bacia, enfiadas decorativamente em meio às comidas que ali foram recolhidas. As madrinhas amarraram com firmeza uma faixa de pano branco em volta da cabeça de seus afilhados, para aí reter a oferenda. Estes foram então instruídos a deitarem-se de bruços e foram completamente cobertos por lençóis. Água de colônia foi aspergida sobre eles e caroços de milho branco cozidos foram lançados em volta das esteiras delimitando o local de repouso. Logo o silêncio reinou. Parte dos materiais usados no bori foi, então, arrumada em uma bancada atrás das esteiras onde dormiam os noviços “borizados”: pombo cozido com farofa, tigelas com muitas frutas. Manjar branco e acaçá completavam o conjunto. As cabeças dos pombos foram dispostas nos pratos com as quartinhas, em meio a arranjos de sangue e penas. No dia seguinte, os noviços deram início ao consumo dos alimentos. A comida foi também partilhada com outros adeptos do terreiro, que contavam com a generosidade do grupo recolhido e vinham pedir um pouco de comida para si. Já quase ao cair da noite a mãe de santo veio “suspender” (encerrar) o bori: desamarrou a faixa de pano que retinha as oferendas de comida na cabeça, recolheu os grãos de milho numa bacia e lavou a cabeça de seus filhos com uma infusão de folhas frescas. Estes foram então instruídos a tomar banho. Ao final, receberam um conjunto de prescrições comportamentais e alimentares que deveriam seguir por um período de duas semanas, como parte do resguardo. Depois de um excesso de atividade o corpo estava frágil, precisava ser protegido (res-guardado) de tudo que pudesse ameaçar o equilíbrio conquistado. A proibição de certas comidas e recomendação de outras era fundamental para o sucesso deste empreendimento.


os percursos da comida no candomblé de salVAdor 

Nenhum comentário:

Postar um comentário