"Não cometeríamos um erro, todos nós, ao
fundamentarmos nossos juízos em lapsos de
tempo demasiado curtos?
Deveríamos tomar os geólogos como exemplo."
(Freud, 'O futuro de uma ilusão')
"Paradoxalmente, o medo libera instintos sígnicos poderosos. A necessidade é o grande mote da criação." (Minuzzi)
a questão árabe/judaica me suscita, antes de tudo, muito medo :: mas de um medo telúrico, geológico ::
vejo essas formações culturais intensas, caso do islã, ou do cristianismo, como revelações do fundo da terra respondendo a clamores
profundamente humanos :: não acho que religiões sejam facilidades que o homem criou, para se iludir ::
não :: ao fundo, são lembranças profundas de uma psique adormecida ((evidentemente, sigo aqui
uma
linha de análise mais dada à psicanálise :: não vejo como fugir de tal linha :: a análise hoje em
dia
desses fenômenos, como no caso, agora, do massacre na redação do jornal Charlie Hebdo, deveria englobar uma espécie
de auscultação subterrânea, do inconsciente :: acho que uma tal ciência ainda se encontre em seu início ::
mas, para ela, deveríamos levar em conta, antes de tudo, que o mito surge como revelação suscitada
pelo medo,
e formações míticas como essas, grandiosas, que sustentam meio continente, um continente
inteiro,
ou um hemisfério inteiro, como na divisão clássica entre ocidente e oriente, são acima de
tudo
liberações originais, conteúdos que a psique humana revelou ((no sentido de trazê-los de uma
profundidade
obscura para a luz de um palco, uma cena, uma visão)), e que funcionam até mesmo como espetáculo,
evidentemente grandioso :: tais visões vêm sempre como que cravejadas de diamantes, pedras preciosas :: e parecem ser anunciadas
como tesouros, que propõem riquezas e o fim do sofrimento :: este, o sofrimento, sempre imposto
pela
condição física, de submissão do humano à matéria, à atividade empírica do mundo :: ao mesmo
tempo,
essas formações que o inconsciente libera representam "cozimentos", no sentido de uma longa
costura,
arquitetada por um período longo de tempo :: nesse período se estabelecem trocas, no plano empírico
da realidade,
que proporcionam acúmulos, estoques de conhecimentos e emoções :: no limite, cada religião é fruto de um vasto período
de sofrimento, na relação do homem com a terra, em seu processo de busca para o alívio da dor
que causa
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planTa :: oliveiRA |
sexualmente,
considerando-se os apelos da hominização ((quando o ser humano eleva-se em relação
ao instinto
básico, passando a controlá-lo e buscando uma condição mais sublime, próxima daquilo
que universalmente
se conhece por "amor" :: na relação do homem com a mulher, ainda, a revelação
mítica aponta
para uma espécie de "domesticação" :: sempre haverá um torpor masculino a ser sossegado
na busca por
um número infinito de mulheres, como frEud viu, ao análisar o inconsciente, e diagnosticar
o anseio
universal pelo retorno ao útero materno :: daí o furor do mito, em sua necessidade de expansão,
e o medo
que nos pode causar qualquer civilização, como agora, no caso dos atentados em paRis ::
quem pode
parar com o cristianismo, no sentido de conter sua onda de dominação, sua libido, seu entorpecimento
oriundo do prazer de governar? :: essas vastidões conquistadas pelo ocidente, a partir da europa, na reunião exata entre helenismo grego e judaísmo
cristão, representam esse medo de perda do aconchego proporcionado pelo útero ((o que a literatura
sagrada chama
mesmo de "paraíso")), possuindo a textura de erupções vulcânicas :: a terrA emana
seus viscos,
suas orientações, que são fruto de seu próprio pensamento íntimo, orgânico :: a terra como
um organismo
vivo e pensante, inteligência pura, lava ardente :: por certo, viver sobre a superfície do planeta é algo repleto de riscos, algo muito perigoso, pois suas paixões
são virulentas, e aquilo que aflora, como tesouro mítico, vai ao encontro de um povo (para redimi-lo), e de encontro
a outros povos (para inevitavelmente pressioná-los, em uma relação de convívio)) :: com isso, há
um
espalhamento de tensões causadas por opulências, por sugestões de contato com a camada
mais viva
e livre da terra, seu prazer, seu estertor, sua intimidade profunda, seu útero, seu feminino sagrado :: depois de 2 mil anos de cristianismo,
a consumir relações e propor degredos, a questão agora é saber se essa espécie de mito comandante
de uma
nave espacial, que é a terra, terá condições para ordernar a concretização de uma convivência
de forças
míticas que não abale estruturalmente o planeta ((como quase aconteceu com a Segunda
Guerra
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miTo :: deusA niX (grécia) |
Mundial :: ao fundo, somos todos muito amados por essa mãe generosa :: na costura de um outro mito que nos sirva para o futuro, e que nos envolva,
como um manto para uma humanidade recém-nascida, é que se dá o trabalho agora da natureZa,
essa eterna
e laboriosa cozinheira :: o drama de seus filhos é real e existe, abalando nossas convicções, e nos enchendo de medo ::
a convivência pacífica entre os diferentes requer tamanha paciência, que somente o medo ((o medo de morrer, o medo
de que nossa viagem pelo cosmo infinito se acabe)) é capaz de torná-la possível :: as costuras por conjunções
são infinitas, muitas vezes ocorrem em segredo, e o tempo vivido em contato multicultural, nesse momento
único da trajetória humana, obrigatoriamente tenso, nos obrigará a fazer submergir do fundo de nossa psique
((agora integrada pelo inglês e a internet)) uma nova solução para os nossos problemas de convivência ::
simplesmente porque ninguém prefere a morte ((só "saúde e sortE", como afirmou o poeta:: nesse sentido, o islã cumpre papel decisivo, pois avisa a europa,
e o estados unidos, sobre a existência de sua natural arrogância, obrigando-nos a um alargamento
de
fronteiras - fronteiras do pensamento humano - que recomponha saberes fundamentais sobre
como
alimentar famintos e dar-lhes bons sonhos, bons sentimentos, na sua necessária vinculação
como o
território e o amor à pátriA :: não é fácil, mas o significado profundo de ser um filho da
mãe terra
encontra-se nesse pertencimento a um sentido quase mágico de superação e heroísmo,
como no caso
dos ensinamentos legados pelos grandes profetas das grandes religiões ((cristo, buda, maomé, moisés :: não sejamos "burros",
e tenhamos a capacidade de entender o sentido dos mitos, mais especificamente em seu aspecto sagrado,
esforçando-nos por incorporar a sacralidade ao nosso modo secular de ser :: é por aí, creio, o caminho a ser seguido ::
arte :: badi assAd
A própria possibilidade de entendimentos já é sacra. Sois, assim, deus e profeta. O medo também parece ampliar a consciência coletiva. As coisas são, acontecem e a gente fica aturdido. Seu esclarecimento indica caminho e também consolo de algum modo a nós que só observamos.
ResponderExcluirGrande abraço, mestre!
Há um desespero, eterno, provocado pela permanente tensão, a provocar o sonhador, deus e profeta :: e isso, efetivamente, é muito sagrado :: obrigado, João, pela atenção...
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